“Estamos aqui para causar desconforto mesmo, questionar. Não podemos mais nos calar diante da violência. Às vezes o Estado prejudica muito mais do que a própria agressão.”
Há algumas semanas, saiu uma importante matéria no jornal Cruzeiro do Sul denunciando a falta de dados em relação à violência contra a mulher. Conversei com a jornalista Daniela Jacinto sobre o tema:
A presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Sorocaba (CMDM), Emanuela Barros, afirma que as estatísticas de violência contra a mulher ficam inviabilizadas no País e em muitas localidades é como se não existisse, porque não tem dados. “Dá uma falsa sensação que não houve. Quando você não tem dado, não tem política pública”, observa.
Emanuela ainda diz que quando os números relacionados à violência contra a mulher existem, eles são subnotificados, mas mesmo assim já indicam que o Brasil vive uma epidemia. “No ano passado foi divulgada uma pesquisa [do Fórum Brasileiro de Segurança Pública] que falava que não existe lugar seguro para a mulher no Brasil nem dentro e nem fora do lar”, lamenta.
Emanuela afirma que no Brasil, a tendência dos governos é mascarar dados. “Aí o problema parece que não existe e a população em geral tem a sensação de que é mimimi. Mas a gente sabe que não é assim. Órgãos internacionais apontam que o Brasil é o 5º mais violento do mundo para as mulheres”, comenta Emanuela, se referindo ao estudo feito pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
Em Sorocaba, as ações de conscientização sobre a violência contra a mulher começaram este ano mais cedo, em 8 de fevereiro, um mês antes do 8 de março, que é o Dia Internacional da Mulher, como forma de desenvolver mais ações e atingir número maior de pessoas, inclusive os homens. A presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Sorocaba (CMDM), Emanuela Barros, fala que o apoio masculino é importante para acabar com essa violência.
E se não tem estatística, é como se não existisse se esse tipo de violência, como se fosse invisível. A gente sabe dos casos pelos noticiários, mas não são divulgados dados oficiais.
A mulher vítima de uma situação de agressão, lembra a presidente do Conselho, costuma ser revitimizada pelo sistema, tanto na delegacia, como no Judiciário, quando não acreditam na sua palavra, quando desqualificam a violência sofrida, quando ela tem de passar por situações vexatórias para provar o que houve. “E se não tem estatística, é como se não existisse se esse tipo de violência, como se fosse invisível. A gente sabe dos casos pelos noticiários, mas não são divulgados dados oficiais.”
Conforme Emanuela, é importante citar o nome feminicídio quando houve morte de mulher justamente devido ao fato de ser mulher ou denominar de violência doméstica quando ela é vítima de agressão por parte de seu companheiro.
“Não podemos mais permitir que mulheres sejam mortas dentro de suas casas, na frente dos filhos, geralmente por motivo banal, porque o marido não aceita a separação. Isso acontece porque o homem se acha dono da mulher, a gente muda isso não com lei mas trabalhando preventivamente, mudando a cultura da violência.”
Emanuela frisa que não se calar é uma atitude muito importante. No dia 2 de março haverá uma audiência pública onde serão cobradas das autoridades essas questões. “Inclusive uma DDM mais perto da mulher, mais centralizada”, afirma.
A presidente do Conselho lembra que a atual delegacia, situada na rua Caracas, 846, Jardim América, está num endereço de difícil acesso. “Fica atrás da pista de caminhada do Campolim, um lugar escuro, longe para caminhar a pé durante a noite [já que o ponto de ônibus fica distante]”, diz.
Qualquer política pública começa com dados. Você não consegue trabalhar sem dados.
Outro problema elencado por Emanuela é o exame de corpo de delito, que precisa ser feito no Instituto Médico Legal (IML). “Mas se a mulher foi violentada na sexta, só vai ser atendida na segunda após o almoço”, observa.
Durante a audiência também será cobrada a formação contínua do profissional que atende as vítimas. “Eu já vi comportamentos ofensores”, diz. Também haverá cobrança com relação aos dados. “Qualquer política pública começa com dados. Você não consegue trabalhar sem dados. Eu não sei quantas trans são agredidas em Sorocaba, não tem esse recorte. Não sei também sobre a mulher com deficiência. Aliás cadeirantes e idosas não conseguem entrar na DDM por causa das escadas.”
Emanuela finaliza dizendo que é função do Conselho da Mulher pensar essas questões. “Estamos aqui para causar desconforto mesmo, questionar. Não podemos mais nos calar diante da violência. Às vezes o Estado prejudica muito mais do que a própria agressão.”
Confira a matéria completa no Jornal Cruzeiro do Sul: https://www.jornalcruzeiro.com.br/sorocaba/faltam-dados-oficiais-sobre-feminicidio-em-sorocaba/